Quando se fala em nacionalismo, a primeira coisa que passa pela cabeça é a imagem de várias pessoas cantando o hino nacional de seu país em frente a sua bandeira, ou então uma hiper-valorização de um indivíduo a respeito de sua terra natal. Mas o que dizer do nacionalismo de uma terra onde as pessoas aprendem desde cedo a admirar mais as qualidades de outros povos do que as suas? E ainda, como criar uma identidade coesa em um país com tamanho continental? Pois bem, compreender o nacionalismo brasileiro obrigatoriamente passa por esses quetionamentos. Analisar o sentimento de nacionalidade e "brasilidade" talvez seja uma das tarefas mais desafiadoras para qualquer antropólogo que se interesse pelo tema.
É interessante ver que a cada 4 anos, o Brasil sofre uma forte onda patriótica. O país inteiro vestindo a camisa amarela da seleção brasileira, e torcendo pelos seus 11 guerreiros que encantam os olhos do mundo nos estádios onde ocorrem as Copas do Mundo. Nesse momento o país do futebol vibra, torce e chora, canta o hino nacional com uma emoção patriótica de dar inveja a qualquer pessoa, pois se vê uma genuína demonstração de amor por sua terra. Pena que é somente de quatro em quatro anos que vemos ese fervor patriótico. A realidade é bem diferente no dia-a-dia do lado debaixo do Equador.
Desde seu achamento pelos portugueses, o Brasil tem sido uma terra onde o objetivo principal de seus desbravadores foi pegar as riquezas, e voltar o mais rápido possível para a sua terra natal. Um dos fatores para essa idéia passar pela cabeça dos colonizadores era o fato de Portugal ter se tornado o primeiro Estado-Nação da Europa, no Séc. XII, sendo a principal potência mundial entre os Séc XIII e XVII. Em outras palavras, Lisboa era a Roma do mundo renascentista. Qualquer cidadão lusitano, pobre ou rico, jamais imaginaria passar a vida em outro lugar senão em Portugal.
Se analisarmos com atenção o que e passava ao lado da terra de Camões, vemos um outro Estado-Nação começando a surgir: a Espanha. A unificação espanhola ocorreu em 1492, e no contexto econômico, tinha que conseguir uma expansão ultramarina urgente, pois Portugal já possuía suas rotas marítimas com as Índias Orientais. O caminho a Oeste do Atlântico foi a saída encontrada para buscar as riquezas do Oriente. O encontro de um novo continente foi fundamental para a expansão colonialista espanhola. A América tornou-se a possibilidade da Espanha crescer quanto potência. O Tratado de Tordesilhas separou não só um continente, mas sim dividiu duas ideologias distintas: enquanto que o lado Oeste (espanhol) representava a possibilidade de expansão, para Leste (português) era apenas mais um pedaço de terra.
Essa visão do Brasil ser apenas um pedaço de terra, onde se pega a riqueza e procura retornar o mais rápido possível para o Velho Mundo, foi o início de uma ótica de desatenção e desvinculação de sua população para com a Terra de Santa Cruz. Mesmo que Portugal, no Séc XVIII, tendo perdido o posto de potência mundial, o sentimento de desvalorização da colônia continuou. Ainda mais nesse momento, onde o número de pessoas mestiças se torna maior que as pessoas brancas. Vale ressaltar que naquela época a noção de pureza de raça era fundamental para possuir não só status, mas também um posto nobre na administração colonial.
Com a chegada do Séc XIX, o iluminismo toma conta do pensamento de todas as colônias americanas, incluindo o Brasil. Porém, enquanto as independências das colônias inglesas e espanhola se deram em forma de Repúblicas, o Brasil foi o único país que se tornou independente através de uma Monarquia. E o mais interessante: uma monarquia lusitana. Em outras palavras, enquanto as colônias americanas tornavam-se estados liberais, desvinculados a sua metrópole, o Brasil continuava com os mesmos ideais absolutistas, altamente vinculados aos valores monarquicos da antiga metrópole. As elites locais, além de justificarem o poder através de suas riquezas, justificavam a subordinação da população devido à sua mestiçagem. Não é em vão que o Brasil foi o último país a abolir o regime escravocrata na América.
Além desses fatores de questão administrativa, as elites nunca olharam com bons olhos a população e a cultura local. Sempre comparavam o "atraso cultural brasileiro" com a "pureza cultural francesa". Mesmo que as elites já não valorizassem mais o Estado Lusitano, elas continuavam a absorver a cultura européia. A desvalorização junto com a cultura brasileira continuou no ideário populacional.
Com a Proclamação da República no final do Séc. XIX, o Brasil começava a criar esboços de afirmação cultural, e começava a engatinhar no sentimento de nacionalidade junto a sua população. A Semana de Arte Moderna de 1922 foi fundamental para criar uma raiz forte de afirmação cultural brasileira. No entanto, politicamente o Brasil continuava fragmentado, pois a disputa entre os Estados Brasileiros não permitiam uma unificação de sentimentos nacionais. Como exemplo podemos recordar como ocorriam as eleições na República Velha, onde MG e SP detinham a centralidade política, e os outros Estados eram marginalizados.
Com a chegada de Vargas no poder, e o fim dos símbolos estaduais em prol dos símbolos nacionais, a identidade brasileira ficou mais nítida no ideário populacional. Mas é claro que vale ressaltar que nesse mesmo período, com os EUA começando a impôr seu modo de vida no continente inteiro, ironicamente o Brasil absorve rapidamente a cultura estadunidense, e vemos nos anos 60 um Brasil que valoriza ao extremo as tecnologias vindas do "irmão" do norte. Fazendo uma pequena ilustração cômica, é a industria de bens de consumo norte-americana fazendo o papel dos espelhinhos que os portugueses ofereciam aos nativos na época do achamento.
O início do Séc XXI promete ser um período onde a valorização da cultura local seja alicerce para a construção de uma identidade latino-americana legítima. E o Brasil desempenhará um papel fundamental para essa identidade, pois o cenário global é favorável a isso. Porém nós brasileiros devemos ter muita clareza desse desafio, para não cair no velho vício de trocar nossos riquezas por quinquilharias estrangeiras. Quem sabe assim a antiga frase: "Brasil, o país do futuro" se torne concreta.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Bem vindo ao mundo dos blógues!!
bjs
Sabe que hoje depois de ler o email e de chorar (sim, eu ainda ando sensível a qualquer forma de afeto), eu pude perceber, mais uma vez, o quanto gosto de ler o que tu escreve.
Postar um comentário